Juros, miséria, inflação, populismo & ortodoxia.

Juros, miséria, inflação, populismo & ortodoxia.

Primeiramente, não espere que este seja um texto de cunho político-partidário, seja lá qual dos lados você escolheu, ou a camisa que você vestiu. A questão é: esse lado ou a camisa (muito provavelmente) não são seus, mas você mesmo não suporta essa realidade.

Muito menos se trata de um texto buscando prever o futuro, melhor deixar esta pauta com os gurus das redes sociais e os videntes da televisão.

Trata-se de um texto sobre Brasil.

Política fiscal, taxa de juros, meta de inflação, nível de desemprego, superávit primário, dentre tantos outros termos seriam “apenas” discussões  teóricas e técnicas sobre a aplicação das mais eficientes práticas econômicas para o bem estar e o desenvolvimento.

Como dito anteriormente: seriam. Se no Brasil não houvesse uma variável que torna tudo mais difícil: a miséria.

Acontece que no Brasil, estamos mais perto de encontrar a Jules Rimet intacta, do que acabar com a miséria.

Afinal de contas, que graça teria definir a taxa de juros, apenas vislumbrando as futuras taxas de crescimento, sem se preocupar que com um pequeno erro, para mais ou para menos na dose, milhares de pessoas podem literalmente morrer?! (Contém ironia).

São necessárias doses de Josué de Castro e Roberto Campos, para entender tal complexidade das terras tupiniquins.

O populismo é um fator facilmente criticável, e seria muito cômodo criar uma utopia em que ele não faz parte do jogo, e discorrer sobre seus ônus, melhor considerá-lo  parte inevitável do jogo, contudo ficar atento às reais atitudes sondadas e tomadas (em sua maioria, se contradizendo com o discurso populista, que por sua vez, em sua maioria é irreal e impossível). E é aí que a cobra fuma.

O lindo discurso de medidas em favor dos pobres e necessitados, cai por terra quando na prática, estas esbarram e confrontam a responsabilidade fiscal & monetária. E é isso que você (provavelmente) não entende.

Para fins explicativos, ceteris paribus, vamos considerar que 2+2 é sempre igual a 4. Não vamos avançar muito nas teorias econômicas, mas sim, buscar uma mínima introdução à lógica do dinheiro público e como isso afeta seu bolso diretamente.

Vamos considerar que um governo se elegeu com base num discurso em favor dos mais necessitados e pobres, e que ele precisa de condições (recursos) para acabar com a pobreza. Devido a problemas passados, e considerando que para um ex-alcoólatra, qualquer gota é um perigo, hoje ele possui um limite de gastos, assim como uma escassez de recursos para realizar seus lindos planos mirabolantes em favor dos pobres.

O que ele faz? Organiza a casa, baixa custos, e tenta fazer que o desenvolvimento seja orgânico? Claro que não! Ele arruma formas de gastar mais, afinal de contas, ele é o governo!

Mas até aí, tudo bem, certo? Não custa nada fazer umas dívidas quando você tem o poder sobre a moeda!

Não, errado.

Com os altos gastos desnecessários e dívidas do governo, ele precisa de cada vez mais dinheiro e por sua vez, para conseguir cada vez mais dinheiro emprestado (considerando a regra do ouro) ele oferece remunerações cada vez maiores àqueles que o emprestarem, sendo essa remuneração, a taxa básica de juros do país.

As consequências destas medidas são várias, mas cabe destacar algumas em especial.

Primeiro, que expandido os gastos de forma irresponsável ele necessitaria de mais dinheiro para arcar com suas obrigações. De onde você acha que esse dinheiro vai vir? E adivinha qual classe vai pagar mais caro? A inflação é a forma mais perversa de tributação, pois atinge principalmente os mais necessitados.

De outra forma, o governo também pode causar uma injeção direta de dinheiro na economia, sem ter a produção efetiva de serviços. Vamos lá, se no país 10 camisas foram produzidas, e vendidas a 1 real cada uma num primeiro cenário, mas logo depois, havia muito dinheiro injetado rolando na economia, sem que a produção mudasse, e agora as pessoas estão pagando 2 reais em cada camisa; a única coisa que aconteceu foi a desvalorização da moeda, visto que, para comprar o mesmo produto, agora é necessário o dobro do dinheiro. Isso é a inflação, que de forma descontrolada, pode ser literalmente fatal (vide Brasil nos anos de hiperinflação).

Existe também a teoria e prática dos multiplicadores, que por parte de uma injeção menor do governo,traria um retorno alavancando na economia privada, aumentando assim a oferta de serviços, mas não de disso que estamos tratando, mas sim, o uso irresponsável de gastos por parte do governo.

Então, chegamos ao cenário de necessitar “retirar” dinheiro da economia, para que haja controle da inflação. E como o governo faz isso? Ele sobe a taxa de juros. Por quê?

Pense, você tem um dinheiro e precisa fazer algo com ele, afinal de contas, se deixar parado, a inflação vai “comer” tudo que você tem. Então você precisa investir esse dinheiro para que ele vire mais. Você analisa a situação e pensa “vou abrir um negócio, empregar pessoas, pagar salários, expandir a produção, melhorar a condição econômica de uma região gerando riqueza e empregando aqueles que necessitam?” Claro que não!

 Por que você arriscaria todo seu suado dinheiro arrecadado em uma vida inteira, se (na teoria) é muito mais seguro emprestar para o governo, o qual está te pagando uma bela remuneração sem você fazer nada?! (A taxa de juros).

Vejamos o carrossel agora por um olhar macro:  o governo prometeu ajudar os pobres e necessitados (desempregados), aumentou seus gastos de forma irresponsável, logo, gerou inflação. Para conter essa alta inflação, aumentou as taxas de juros a fim de retirar dinheiro da economia e frear a alta dos preços. Acontece que dessa forma, todo o dinheiro que seria usado para desenvolver o país e gerar empregos, tirando o povo da miséria, agora está sendo mantido no banco, rendendo juros para aqueles que possuem mais recursos financeiros.

É na prática, o de cima subindo, e o de baixo descendo (e ainda, sem considerar o aumento na carga tributária). Temos uma população em grande parte desbancarizada, afinal de contas, os mais necessitados não possuem acesso aos serviços bancários para fazer seu dinheiro render, logo, o efeito da inflação será fatal. É um looping infinito de desigualdade social, até podendo chegar num cenário de estagflação (onde se tem ao mesmo tempo estagnação da economia, e inflação).

Da mesma forma, o inverso é válido: taxas de juros muito baixas, podem causar uma aceleração desenfreada da economia, aumentando a inflação e matando as pessoas de fome, pois não conseguiriam comprar o básico.

Quando falamos de política fiscal e taxa de juros no Brasil, não é como em outros países, que está sendo apenas discutido o nível de retorno dos investimentos ou a performance superficial da economia. Estamos falando sobre a barriga vazia de alguém, a falta de oportunidade que os mais necessitados terão na vida.

Recentemente ouvimos falar até da aplicação da teoria monetária moderna (ou para os mais íntimos, “MMT”) no Brasil, para justificar as gastanças. Tal teoria prega a injeção direta de dinheiro na economia, sem consequências de desvalorização (em resumo). Sondar isso é de uma perversidade sem tamanho, ou de um desconhecimento colossal sobre nosso passado econômico. Levando em consideração principalmente o período de hiperinflação e crise da dívida externa (leiam sobre) é passar a mão no seu bolso, enquanto lhe chamam de palhaço. No Brasil, a aplicação da MMT nada mais seria do que um cheque em branco para uma farra infinita e descontrolada dos recursos públicos e com uma fatura que seria paga por você.

Por outro lado, há aqueles que defendem que o governo não deve gastar com nada. Visão também distante da realidade, visto que os interesses e necessidades coletivos só são alcançados por meio do Estado.

Já diria Delfim Netto, “A ideia de que, se deixar tudo livre, o mundo caminha para o equilíbrio é achar que Deus era economista.” Assim como também ponderou, “Se é absurdo pensar que o mercado resolve todos os problemas, é mais absurdo ainda sugerir que o governo possa fazê-lo”.

É necessário um equilíbrio certeiro e eficiente entre a esfera pública e a produção privada.

Não se deixe levar pelos discursos em massa. Enquanto você defende aquele que lhe promete ajuda, na verdade você pode estar cavando a sua própria cova.

Gabriel Gadelha
Gabriel Gadelha
Gabriel Gadelha é entusiasta dos estudos econômicos e atua nas partes econômica, societária e financeira; é diretor do Recife Business Hub, formando em direito, foi presidente e diretor da liga de mercado financeiro da UNICAP, possui diversas especializações na área de economia, negócios e finanças, e é sócio fundador da empresa de investimentos e finanças corporativas GM. Partners.

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